segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Cidades Mesopotâmicas: História e Representação

O mundo urbano - espaço profano e sagrado.

A antiga Mesopotâmia foi fundamentalmente uma civilização urbana. As causas da origem dos grandes centros urbanos continuam em discussão, mas hoje podemos afirmar que o principal fator foi o desenvolvimento dos templos, que exerceram um papel religioso, mas também econômico e administrativo. Segundo os próprios mesopotâmicos, as cidades eram o lugar de moradia dos deuses e possuíam três funções principais: centro político, centro de comércio e centro religioso.

Os textos mesopotâmicos sublinham a origem divina das cidades, e ao mesmo tempo, relatam que suas realizações foram obras dos reis e seus suditos. Cada divindade do panteão possuía sua residência principal, sua cidade predileta.

(...) diferentes grupos populacionais existentes na Mesopotâmia estabeleceram relações entre si, eram pastores do deserto, pescadores dos pântanos e agricultores das planicies. Eles formaram um núcleo de contato com os povos de áreas montanhosas distantes, em busca de matérias-primas inexistentes no sul da região, tais como pedra, metal e madeira. Iniciou-se, assim, um processo de diferenciação social, onde um grupo conquistou o monopólio sobre a produção da riqueza daquela sociedade.

Muros da Cidade de Uruk


Em 3.500 a.C, surgem centros como Uruk, com uma instituição urbana fundamental - o templo, construído sob uma plataforma monumental, simbolizando visivelmente seu poder. E foi sob a responsabilidade destes templos que vários aspectos da sociedade surgiram: a escrita, o Estado, o sistema jurídico, a arte e a arquitetura, entre outros.

Por volta de 2.800 a.C, iniciaram-se disputas pela hegemonia política dos territórios vizinhos (...). O resultado dessas guerras transformou o desenvolvimento dessas cidades: as revoltas no interior do pais levaram a uma migração significativa do campo para a cidade, fazendo com que a maioria da população se tornasse urbana; maciças fotificações foram construídas para garantir a segurança destas cidades, definindo assim a diferença entre o espaço urbano e o rural e restringindo o acesso às cidades a determinados pontos.

As necessidades de guerra exigiam um maior desenvolvimento da autoridade política e militar, fazendo nascer a segunda principal instituição urbana - o palácio. As cidades mesopotâmicas passaram então, a contar com dois centros de poder: um político e militar o palácio, e outro econômico e religioso o templo, um espaço profano, outro sagrado.

O papel do templo e do palácio:

A única característica arquitetônica que pode ser imediatamente localizada nas cidades do sul mesopotâmico é o templo principal (templo em sumério é É.KUR, em acádio ekurru, cula tradução é a casa da montanha) que pode ou não estar acompanhado de um zigurate (é uma construção em forma de pirâmide escalonada em cujo topo era construído um templo). Os templos não eram sempre localizados no centro da cidade. Os zigurates de Isin e outros estão localizados junto a borda do sítio, enquanto que em Uruk estão simetricamente dispostos. Isto pode ser entendido como uma separação física entre o domínio do sagrado e do profano.

A segunda maior instituição urbana, o palácio (palácio em sumério é E.GAL, em acádio ekallum, cuja tradução literal é a casa grande, aquela que abriga o LUGAL, o homem grande, o rei), é de mais difícil localização, pois não se erigiu sobre uma platarforma como o templo. Também não há evidências de que todas as cidades tenham tido palácios,(...) as cidades não tinham reis, apenas governadores.(...)

Os palácios mesopotâmicos não eram apenas residênciais, cerimoniais ou centros administrativos, mas, sim um conjunto arquitetônico incluindo templos secundários, silos e oficinas de artesanato. As construções do sul mesopotâmicos que se enquadram na categoria "palácio real" são todas associadas a soberanos independentes.

(...)

Na maioria dos sítios arqueológicos mesopotâmicos, a localização dos templos e dos centros administrativos reflete um modelo de oposição, onde o paralismo conflitivo de funções das duas instituições mais importantes da cidade está claramente simbolizado.

Cidades - moradia dos deuses:

Nos períodos de Isin-Larsa e Paleobabilônico foram construídos zigurates na maior parte das cidades mesopotâmicas e, na época Neobabilônica eles foram restaurados ou reconstruídos.

Localização das cidades mesopotâmicas

Larsa e o modelo urbanístico: O sítio de Larsa é pouco elevado e recobre uma área total de 190ha.

Sabe-se que antes do III milênio a.C. Larsa já era ocupada por populações sumérias e que depois da queda do império de Ur uma dinastia amorrita se instalou e garantiu sua hegemonia política na região por mais de dois séculos, tendo alcançado seu apogeu durante a época chamada de Isin-Larsa, até a cidade ser conquistada por Hammu-rabi da Babilônia (organizador de uma coletânea de sentenças "legais e morais" gravadas em um diorito negro que ficou conhecido como "Código de Hammurabi". Ele é tido como um símbolo de justiça por defender os direitos de seus povo), num cerco que durou de 6 meses e envolveu um exército de 40.000 homens.

O sucessor de Hammu-rabi, Sansu-iluna, perdeu o controle da regiões do sul do país e, ao longo de 300 anos, Larsa não forneceu nenhuma documentação. (...) O último rei desta dinastia, Nabonida restaurou o zigurate (...). Depois da conquista da Babilônia por Ciro, rei persa, o santuário continuou existindo. Ainda no templo de Samas (o deus sol), foi encontrado um documento da época de Alexandre Magno. O material cerâmico permite constatar a sobrevivência da construção até fins do século II e início do século I a.C. Tal permanência, a uma data tão tardia,mostra a importância do templo de Samas, coração e ponto central da cidade de Larsa durante vários milênios.

A partir de fotografias aéreas, foi possível estabelecer um levantamento preciso da cidade:

- Um bairro administrativo e religioso, onde estavam situados o templo e E.babbar (a casa brilhante, o templo do deus sol), o palácio de Nûr-Adad e os conjuntos de grandes edifícios.

- Um bairro residencial, onde o povoamento era mais denso e onde havia inúmeras casas no centro, enquanto que, na periferia, encontramvam-se prédios de signicativas dimensões:

- Um bairro intermediário, abrigando, também, moradias e fornos os quais testemunhavam uma atividade importante.

- Larsa possuia um verdadeira estrutura urbana, com zonas distintas: um bairro administrativo e religioso, com templos e palácios; uma zona de grandes residências na periferia, tudo isso contrastando com o centro, denso e ocupado por pequenas casas; e mais ao sul, uma zona de atividade artesanal.Os habitantes viviam à sombra dos grandes santuários. Ruas estreitas delimitavam blocos compactos de habitações cujas fachadas apresentavam apenas portas estreitas.


Babilônia, capital do mundo: Babilônia (Bâb-ilim significa, literalmente "a porta de deus") foi o principal pólo religioso e cultural do sul mesopotâmico e a capital do maior império do mundo oriental anterior aos Persas. Ela foi construída à beira do Rio Eufrates, a cerca de 90km ao sul da atual Bagdá.

No final III milênio a.C. Babilônia era uma cidade modesta, submetida à IIIª dinastia Ur, mas quando as populações amorritas invadem o sul da Mesopotâmia no século XIX a.C a Iª dinastia da Babilônia domina a região e torna-se uma potência, sob o comando de Hammu-rabi. Mas a unidade política habilmente conquistada demonstrou-se frágil ao longo de dois séculos e, em 1595 a.C, a cidade foi tomada pelos hititas, povos do norte anatólico, atual Turquia, transformando-se, então, em uma cidade de menor importância no cenário político.

Sob o domínio assírio a cidade foi parcialmente destruída e depois reconstruída (...).

A cidade conheceu um novo momento de grandiosidade sob a dinastia neobabilônica, quando tornou-se, efetivamente, a capital do mundo oriental.

O mais famoso de todos os zigurates é o da Baiblônia, É.TEMEN.AN.KI (a casa da fundação do céu e da terra), e que é a inspiração para a Torre de Babel bíblica. A estrutura original foi construída por Hammu-rabi e restaurada por Nabuconossor II rei da dinastia caldéia.


Da Torre de Babel subsistem apenas suas fundações construídas sobre um plano quadrado de 92m de lado. O interior era de tijolos secos ao sol, enquanto as paredes externas eram de tijolos cozidos, com 15m de espessura. Ela teria atingido uma altura de no mínimo 55m o que necessaria cerca de 36 milhões de tijolos para sua construção. A torre teria sete andares, sendo que os quatro andares inferiores eram pintados de branco, preto, rosa e azul respectivamente. Cada andar simbolizaria, pela sua cor, os cinco grandes planetas que os babilônicos conheciam: Saturno, Júpiter, Marte, Vênus e Mercúrio, além dos dois satélites, o Sol e a Lua. A Torre de Babel serviria a duas funções principais: uma de caráter científico, para observação astronômica diária realizadas pelos escribas e registrada em tabletes de argila e outra, de cunho religioso, pois os mesopotâmicos acreditavam que os zigurates mais altos permitiam a descida dos deuses à terra a fim de aliviar os males e os sofrimentos dos homens.

Na concepção mesopotâmica, a cidade era o lugar onde residiam os deuses, e o santuário era edificado para abrigar a sua residência. Nos textos conhecidos como "lamentações" sobre as cidades destruídas, a existência das mesmas é objeto de longas discussões entre os deuses antes de decidirem o seu destino. Estas lamentações descrevem a destruição das cidades e, com isto ao desaparecimento dos cultos. Nelas o aniquilamento é atribuído a uma decisão tomada pelos deuses. Elas descrevem ainda a restauração das cidades, de seus templos e o retorno dos deuses.

Apoiadas em acontecimentos históricos reais, como guerras de conquista e destruição das cidades, estas composições literárias são significativas da estreita relação que havia entre a cidade e sua divindade principal e do papel do rei de mantenedor desta relação privilegiada, pois ele deveria cuidar do estado dos templos, devendo construir, retaurar e organizar as casas dos deuses, pois o templo era o coração da cidade e a razão de sua existência.

Fonte de pesquisa: Anos 90 - Revista do programa de pós-graduação em história. História Antiga e Arquelogia Dossiê Projeto Apollonia. Porto Alegre - nº 17/Julho 2003 - págs 61 a 73

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posted by Charles

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